Escalada inflacionária assombra o País

IPCA-15 de abril tem a maior alta para o mês desde 1995 e confirma as projeções cada vez mais pessimistas dos analistas privados, inclusive em relação ao ano que vem

Notas&Informações, O Estado de S.Paulo


Há mais de dois anos a maioria dos trabalhadores brasileiros não tem aumentos reais. A inflação tem sido sistematicamente maior do que a correção salarial. Novas perdas devem ocorrer, pois o cenário está ficando mais sombrio. Nunca, nos últimos 27 anos, o aumento médio dos preços tinha sido tão alto no mês de abril como o registrado agora. A variação de 1,73% do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15 (IPCA-15) em abril é também a mais alta para qualquer mês desde fevereiro de 2003. O acumulado de 12 meses, de 12,03%, é o maior desde novembro de 2003.

Calculado pelo IBGE, o IPCA-15 antecipa a inflação do mês. O resultado de abril mostra que, do ponto de vista dos preços, o País parece ter voltado para o início do Plano Real (de julho de 1994), quando, depois de conviver com a hiperinflação, os agentes econômicos se adaptavam à nova realidade. Ou, na outra comparação, para o início do primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, marcado por desconfianças que fizeram a taxa de câmbio e os preços explodirem.

A aceleração inflacionária comprime a renda real e mesmo trabalhadores formais têm perdas. O boletim Salariômetro, elaborado pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas, por exemplo, mostra que, das negociações coletivas concluídas em março por empregados e empregadores, 49% não repuseram a inflação. O reajuste mediano no mês foi igual à inflação. Há 25 meses seguidos a mediana é menor ou igual à variação do INPC, índice que corrige salários.

O IPCA-15 confirma a notável deterioração das expectativas entre os analistas das principais instituições financeiras consultadas regularmente pelo Banco Central (BC) para a elaboração do boletim Focus. Em quatro semanas, a mediana das projeções para o IPCA em 2022 saltou de 6,86% para 7,65%. A leitura dos cinco últimos boletins mostra uma contínua alta da mediana do IPCA para este ano: 6,86%, 6,97%, 7,43%, 7,46% e 7,65%. A piora das projeções do IPCA se estende para 2023. Em quatro semanas, a estimativa para a inflação no ano que vem passou de 3,80% para 4,00%.

Fatores que vêm impulsionando a alta do IPCA nos últimos meses não se alteraram. Com alta de 3,43%, os preços no grupo de transportes foram os que mais pesaram no IPCA-15 de abril. A gasolina subiu 7,51%. O preço da alimentação subiu 2,25%, em razão do aumento dos itens consumidos em domicílio. Mas a alta é disseminada, pois praticamente 80% dos itens que compõem o índice ficaram mais caros em abril.

É possível que alguns componentes que empurraram os preços para cima percam alguma força nos próximos meses e a inflação de 2022 até fique abaixo das projeções hoje dominantes. A cotação das commodities no mercado internacional, cuja alta vem tendo forte influência nos preços internos, pode se estabilizar. O fato de a taxa de câmbio não ter explodido por causa da guerra na Ucrânia também favorece os preços internos. O Focus mostra redução no valor projetado pelos analistas do mercado para o dólar no fim do ano. Há, porém, um movimento de alta do dólar, cujo vigor ainda é difícil de avaliar, pois em boa parte decorre do comportamento cada vez mais preocupante do presidente Jair Bolsonaro, obcecado em ganhar apoio político ou pelo menos manter o de que dispõe.

A guerra continua impondo dificuldades para o abastecimento mundial de itens essenciais para a economia, como petróleo e gás, e para as pessoas, como trigo. Há pressões sobre a atividade econômica e a inflação em todo o mundo. Medidas mais duras estão em exame ou sendo executadas por autoridades monetárias em vários países. Em alguns, como os Estados Unidos, o endurecimento de medidas para conter a inflação pode ter repercussão mundial.

É nesse cenário, marcado por deterioração de expectativas internas com relação à inflação e pressões externas sobre a economia, que o Comitê de Política Monetária (Copom) do BC terá de decidir sobre a nova taxa básica de juros, atualmente em 11,75% ao ano, e se confirma sua sinalização de que o ciclo de aperto monetário se encerraria em maio.

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