Fizemos a checagem da entrevista da deputada Bia Kicis ao CB.Poder

O Holofote verificou algumas informações dadas pela parlamentar eleita

CORREIO BRAZILIENSE


(foto: Ana Rayssa/Esp. CB/D.A Press)

Bia Kicis (PRP), a terceira deputada federal mais bem votada no Distrito Federal nas eleições de 2018, foi a entrevistada do CB.Poder na quarta-feira (9/1). No programa, parceria do Correio Braziliense com a TV Brasília, ela fez comentários sobre ideologia de gênero, a escolha do novo secretário de Saúde e a disputa da Presidência da Câmara dos Deputados. O Holofote verificou algumas informações ditas pela parlamentar. Confira:

"Não creio que gera insegurança para a população (um dos filhos do Bolsonaro ser porta-voz do pai). Isso gerou o filho do Lula, que era catador cocô de elefante no zoológico e hoje é um bilionário com jato e os aviões mais caros do mundo"


É verdade que Fábio Luís Lula da Silva, o Lulinha, trabalhou como monitor do Parque Zoológico de São Paulo. O filho mais velho do ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva com a ex-primeira-dama Marisa Letícia ganhava, com esse trabalho, R$ 600 em 2003, ano em que o pai assumiu o governo federal. De fato, a partir de então, o patrimônio de Lulinha registrou uma alta considerável, alcançando dígitos milionários e rendendo investigações da Polícia Federal.
O exagero na declaração de Bia Kicis refere-se a dois pontos: ao “bilionário" e “ao jato e aos aviões mais caros do mundo” atribuídos a Lulinha. Ambas as informações foram alvo de verificações realizadas por agências e núcleos de checagem de fatos do Brasil. No primeiro caso, o Projeto Comprova teve acesso a um laudo pericial elaborado pela Polícia Federal que detalha o patrimônio de Lulinha. Os agentes identificaram que, entre 2004 e 2014, ele teve cerca de R$ 5,2 milhões — e não bilhões — de rendimentos brutos. Mas a conclusão da perícia é de que a evolução patrimonial do filho mais velho de Lula foi compatível com as sobras financeiras e que não havia irregularidades nas movimentações, como consta em verificação do Comprova em 8 de agosto de 2018.

Quanto às supostas aeronaves, trata-se de mais um boato atribuído a Lulinha. Notícias falsas sobre aquisições milionárias relacionadas a ele circulam com frequência na internet, como a compra de uma ilha em Angra dos Reis (RJ). Lulinha também seria dono da Friboi e proprietário de uma fazenda em São Paulo. Todas essas acusações foram desmentidas pelo núcleo de checagem de fatos Boatos.org, assim como a posse do suposto jato.

"A indicação do Rafael Parente eu não posso concordar. Se você pega o histórico dele, você vê que ele sempre defendeu a ideologia de gênero nas escolas"

O Secretário de Educação do DF publicou, em suas redes sociais, textos e links sobre questões relacionadas ao tema, como machismo, equidade de gênero e transição de gênero. No entanto, há dois pontos da fala da deputada federal eleita que podem ser debatidos. O primeiro é que nenhuma das publicações encontradas pelo Holofote defende o conceito de “ideologia de gênero”. De acordo com as pessoas que utilizam a expressão de forma crítica, ideologia de gênero seria a negação da existência de dois sexos, o feminino e o masculino.
Em abril de 2015, Rafael Parente compartilhou uma notícia do portal UOL — “Pais narram transição de gênero de filho de cinco anos”. Embora o link tenha, de fato, relação com a “ideologia de gênero”, não é possível afirmar que o atual secretário tenha defendido o tema só por ter compartilhado uma matéria. Inclusive, Parente explica em seu perfil no Twitter que “Compartilhamento de notícias não significa o endosso de opinião”. 

O outro ponto da fala de Bia Kicis que merece atenção é quando ela afirma que Rafael Parente defendeu a ideologia de gênero nas escolas. Não encontramos qualquer evidência de que Parente tenha atuado ou defendido, de qualquer forma, para que o tema seja incluído nas escolas.

Além disso, o secretário afirmou, ao longo das últimas semanas, após o surgimento da polêmica, que vai atuar dentro do programa de educação proposto pelo governador Ibaneis Rocha. Também em entrevista ao programa CB.Poder, Parente prometeu combater a “ideologia de gênero” nas escolas.

"A ideologia  de gênero é uma teoria que prega que homens e mulheres são iguais, e a questão do gênero é cultural, não tendo nada a ver com a biologia. Eles chegam ao cúmulo de dizer que uma criança, ao nascer, não é menino nem menina. Isso é posto em prática no Brasil inteiro, como no colégio Pedro II, no Rio de Janeiro, em que os meninos eram incentivados a ir de saia para a escola"



No dicionário, gênero é um “conceito de ordem geral que abrange todas as características ou propriedades comuns que especificam determinado grupo ou classe de seres ou de objetos”. A definição de ideologia, mesmo no dicionário, carrega uma carga negativa ou positiva, dependendo do objetivo de quem a usa. Assim, pode ser o “tratado das ideias de forma abstrata” ou o “conjunto de concepções abstratas que constituem mera análise ou discussão sem fundamento de ideias distorcidas da realidade”. 

No mundo acadêmico, a ideologia de gênero é debatida desde a década de 1960, mas o termo mudou para “teoria de gênero” ou “estudo do gênero” por causa da carga pejorativa da palavra “ideologia”.

Do ponto de vista sociológico, o doutor em sociologia Rogério Junqueira define como “processos de naturalização das relações de gênero a subordinação das mulheres, a assimetria de poder e de acesso aos recursos por parte das mulheres em relação aos homens. De acordo com tal entendimento, são manifestações de ideologias de gênero o machismo, o sexismo, a misoginia, a homofobia”. 

Sobre o caso do Colégio Pedro II, no Rio de Janeiro, o fato ocorreu em 2016. Naquela época, a direção da escola, tradicional na cidade, determinou que o uniforme seria saia, calça ou bermuda, mais a camisa com a marca da instituição, porém, sem discriminar se era para meninos ou meninas. “Não se trata de fazer ou não distinção de gênero. Trata-se de cumprir resolução do Conselho Nacional de Combate à Discriminação LGBT (órgão ligado ao Ministério da Justiça). Eu apenas descrevo as opções de uniforme; deixo propositalmente em aberto, para o uso de acordo com a identidade de gênero”, explicou, à época, o reitor Oscar Halac à reportagem do jornal O Estado de S. Paulo. Para a revista Veja, uma mãe de aluno, integrante de uma das quatro comissões de pais, afirmou que o pedido para que o uniforme não tivesse distinção de gênero veio dos próprios alunos.

"Em Brasília, houve uma escola no Paranoá em que, numa festa no final do ano, agora em 2018, a diretora mandou uma carta dizendo para as meninas irem vestidas de príncipe e os meninos de princesa. Os pais se revoltaram e foi uma professora que denunciou"

Não há informações que comprovem tal afirmação. O Holofote entrou em contato por telefone com a Regional de Ensino do Paranoá, que desconhece a suposta festa de fim de ano mencionada pela deputada federal no centro de ensino da região administrativa. A pedido do núcleo de checagem de fatos do Correio, um levantamento por colégio da cidade é realizado pela Regional, mas, até o momento, não foi concluído.

No ano passado, houve uma polêmica envolvendo uma escola pública do Paranoá, mas relacionada a banheiros mistos. Levantamento feito pelo Holofote confirmou que o caso aconteceu em novembro de 2018. À época, a diretoria informou que não havia um projeto pedagógico específico para o banheiro compartilhado, mas que a iniciativa buscava prevenção de abuso infantil e cuidados com o corpo.

Com checagem de Ana Carolina Fonseca, Guilherme Goulart e Leonardo Meireles

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