Vídeo obsceno gera crise que pode atrapalhar até articulação para reforma

Líderes do Congresso, que antes reclamavam da falta de interlocução com o Planalto, agora criticam post do presidente Jair Bolsonaro em rede social. Estratégia da defesa é colocar o pesselista como 'homem do povo' e chamar o apoio de eleitores

LC Leo Cavalcanti RC Rodolfo Costa
Correio Braziliense

Aposta dos aliados é colocar o ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional,
 Augusto Heleno, como responsável pelo presidente
(foto: AFP / Sergio LIMA )

O presidente Jair Bolsonaro inseriu o governo no centro de uma crise que pode até atrapalhar a articulação política pela aprovação da reforma da Previdência. A publicação do chefe do Palácio do Planalto de um vídeo obsceno em uma rede social gerou mal-estar entre líderes dispostos a compor a base aliada. O sentimento de alguns é de que o capital político do pesselista vem se reduzindo. Na prática, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) encaminhada pelo governo pode ser aprovada no Congresso. O risco de Bolsonaro se enfraquecer, entretanto, dificulta a possibilidade de passar uma reforma nos moldes pretendidos pelo Planalto. 

A insatisfação de congressistas em relação a Bolsonaro não é recente. Na reunião de líderes com o presidente, na última terça-feira, deputados alertaram para o risco de o presidente tratar a imprensa como inimiga e criar um clima de “Fla-Flu” com parlamentares da oposição, o “nós contra eles”. A manifestação do pesselista nas redes sociais só reforça a ideia de que o aviso entrou por um ouvido e saiu pelo outro. “O chefe de Estado tem que ser o equilíbrio da nação, e não alguém que vai provocar e dividi-la”, criticou o deputado José Nelto (Podemos-GO), líder da legenda na Câmara.

O controverso vídeo publicado por Bolsonaro repercutiu mal. Os líderes, termômetros do clima em suas respectivas bancadas, expressam a preocupação. “Como dar crédito a um presidente que divide a nação? A cada dia que passa, o governo fica mais refém do Congresso. O governo está sem articuladores e o (presidente da Câmara) Rodrigo (Maia) se cacifa para ser o fiador da reforma. Se continuar falando bobagem, o presidente vai perder liderança e não terá aliado que vai elevar o capital político”, analisou Nelto.

A avaliação central dos líderes é de que Bolsonaro precisa construir uma comunicação de Estado, e não dividir o país. “O presidente parece que ainda está em campanha, o que não é adequado. É preciso colocar a Previdência como prioridade, e não desviar o foco entre conservadores e progressistas”, analisou o deputado Daniel Coelho (PPS-PE), líder do partido na Câmara. O deputado Pedro Lucas Fernandes (PTB-MA), líder da legenda, endossa o coro. “É preciso se engajar no debate da Previdência e tratá-la como prioridade, e não arranhar um produto nosso, que é o carnaval”, criticou.

A polêmica não contamina a equipe econômica de Bolsonaro, mas redobrará o trabalho do ministro da Economia, Paulo Guedes. Na última semana, os líderes pediram que o presidente seja o “garoto propaganda” da reforma da Previdência. Depois da controvérsia, a avaliação da base aliada é de que caberá ao núcleo econômico convencer a sociedade. “Bolsonaro está em desprestígio não apenas com os parlamentares, mas também com os governadores”, afirmou um líder.

Defesa

Entre aliados, a avaliação é de que o Planalto será “governado” pelo ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno. O ministro, responsável pela gestão de crise do governo, se reuniu ontem com Bolsonaro. Para congressistas, será ele o responsável por aconselhar o presidente e resgatar o prestígio com o Parlamento. O Planalto saiu em defesa do presidente. Em nota, a Secretaria Especial de Comunicação Social da Presidência acusa o vídeo publicado por Bolsonaro de crime contra os “valores familiares e as tradições culturais do carnaval”. Comunica ainda que o presidente não quis criticar o carnaval de forma genérica e que, além dele, as imagens “escandalizam grande parte da sociedade”.

A ideia de Bolsonaro em publicar o vídeo foi se passar por um “homem do povo” com a mesma opinião do “grande eleitorado”, aponta um interlocutor. Algo próximo ao que os ex-presidentes Jânio Quadros e Fernando Collor faziam. Marqueteiros e consultores políticos ouvidos pelo Correio alertam, contudo, para uma estratégia arriscada do capitão reformado. “É como se ele não tivesse tirado a camisa de candidato”, considera Carlos André Machado, diretor do Instituto Opinião Política, que faz pesquisas eleitorais e de avaliação de governos.

Por mais cedo que possa ser para avaliar ou mesmo identificar a estratégia de Bolsonaro, as ações são feitas a partir de monitoramento de redes sociais, que tem limites para análise de impacto e plano mais efetivo dos movimentos do presidente. Para Machado, por mais que Bolsonaro esteja incomodado com as críticas de foliões, o foco agora é a reforma da Previdência. “Assim, o tempo é que vai dizer como o governo vai se movimentar para mostrar estratégia”, ponderou.

Como no período eleitoral, Bolsonaro fala para o próprio grupo de apoiadores, que o defende no mundo digital, mas não amplia tal rede de proteção. Isso complica quando a reação parece vir de reações emocionais por causa de críticas. Especialista em campanha digital e professor da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM-SP), Marcelo Vitorino diz que ainda é cedo para maiores julgamentos e até mesmo para prever como o governo sobreviverá a crises, mas não há dúvidas de que o que está em jogo é a credibilidade. “Não creio que tudo seja uma estratégia para algo. Há nas mensagens componentes de livre manifestação. O tempo é quem vai dizer se isso é uma estratégia que possa ser prejudicial.”

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Em novo caso de nudez, corredora sai pelada em Porto Alegre

Multinacional portuguesa Politejo vai instalar nova fábrica em Pernambuco

Foragido que fez cirurgia e mudou de identidade é preso comprando casa na praia