Bolsonaro ameaça democracia; Mourão e Heleno minimizam

Divisionista e autoritária, fala é a mais grave já feita no cargo

KENNEDY ALENCAR 
São Paulo

Em pouco mais de dois meses de governo, o presidente Jair Bolsonaro fez ontem uma clara ameaça à democracia. Durante cerimônia militar do 211º aniversário do Corpo de Fuzileiros Navais, no Rio de Janeiro, ele disse que a democracia e a liberdade no país dependiam do desejo das Forças Armadas.

“A missão será cumprida ao lado das pessoas de bem do nosso Brasil, daqueles que amam a pátria, daqueles que respeitam a família, daqueles que querem aproximação com países que têm ideologia semelhante à nossa, daqueles que amam a democracia. E isso, democracia e liberdade, só existe quando a sua respectiva Força Armada assim o quer”, afirmou o presidente.

É lamentável que dois generais da reserva, o vice-presidente Hamilton Mourão e o ministro do Gabinete Institucional, Augusto Heleno, tenham que vir a público minimizar uma fala do presidente que é divisionista, autoritária e uma evidente ameaça à democracia.

Ao dar à sua vitória o caráter de “missão”, ele adotou também um tom messiânico. Levando em conta o histórico de defesa da ditadura militar de 1964 e a dedicação do voto pró-impeachment de Dilma a um torturador (Carlos Alberto Brilhante Ustra), trata-se da mais grave declaração de Bolsonaro desde quando assumiu o poder.

O presidente deveria ler os artigos 1º e 142 da Constituição Federal. O parágrafo único do artigo 1º diz o seguinte: “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.

O artigo 142 afirma que as Forças Armadas “são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem”.

Ou seja, a democracia existe por vontade do povo, que celebra um contrato que tem o nome de Constituição. Essa vontade soberana prevê a existência de instituições como as Forças Armadas. Os militares estão subordinados ao poder civil e não tutelam a democracia nem a liberdade.

Como deputado federal, Bolsonaro nunca teve entre os seus predicados a inteligência e o brilho. Mas nenhum estúpido chega à Presidência da República. Há método na defesa da selvageria como arma política, como no episódio do “golden shower”.

Em dois meses, ficaram evidentes o despreparo de Bolsonaro para governar e a falta de respeito com que trata o cargo mais importante do país. Jair Bolsonaro é presidente de todos os brasileiros, dos que votaram nele e dos que optaram por outros candidatos.

A defesa da barbárie, porém, é uma arma política para mascarar esse despreparo. Cria confusão para não explicar, por exemplo, suspeitas de corrupção e a falta de rumo nas articulações da reforma da Previdência. Essa estratégia serve a uma guerra cultural que prega a regressão social e o fundamentalismo político.

Mais uma mentira

Numa live no Facebook, Bolsonaro criou ontem mais uma fake news. Fez escândalo com imagens da anatomia humana. Pegou uma cartilha para adolescentes do Ministério da Saúde com informações pertinentes sobre sexualidade e DSTs (Doenças Sexualmente Transmissíveis) e a transformou num “novo kit gay”.

Ao governar assim, será difícil entregar resultado.

Caixa 3?

É preocupante que procuradores da força-tarefa da Lava Jato queiram criar uma fundação para gerenciar recursos bilionários obtidos no curso da investigação. No caso da Petrobras, o dinheiro deveria ser devolvido à União, acionista majoritária da estatal.

Parece tentativa de criar um poder paralelo às instituições da República. Como disse um amigo, criaram o caixa 3: usar dinheiro que deveria ir para os cofres públicos a fim de fazer proselitismo político.

O ministro do STF Marco Aurélio Mello acertou ao criticar o que chamou de “Babel”. O Supremo Tribunal Federal e a Procuradoria Geral da República deveriam examinar com atenção esse assunto. 

Ouça abaixo os comentários feitos ontem no “Jornal da CBN – 2ª Edição”:

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