Leis combatem feminicídio e protegem órfãos da violência

Entre janeiro e dezembro de 2022, Alepe criou sete normas sobre o tema

André Zahar e Helena Alencar

72 mulheres foram vítimas de feminicídio em Pernambuco ao longo de 2022.

Ao longo de 2022, 1,4 mil mulheres foram mortas no Brasil somente pelo fato de serem mulheres. O número representa um homicídio a cada seis horas. Em Pernambuco, no mesmo período, foram registrados 72 feminicídios, segundo a Secretaria Estadual de Defesa Social (SDS-PE).

No intuito de enfrentar esse tipo de crime e proteger a sociedade pernambucana, entraram em vigor, no ano passado, sete normas com foco na violência contra as mulheres, todas de iniciativa de parlamentares da Alepe. Duas delas estabelecem políticas públicas estaduais de enfrentamento ao feminicídio (Lei nº 17.665) e de proteção e atenção integral aos órfãos e órfãs em razão desse tipo de crime (Lei nº 17.666).

Outra medida determinou que o relatório anual sobre a ocorrência de feminicídios em Pernambuco contenha informações socioeconômicas das vítimas. A Lei nº 17.829 indica a especificação de dados como a origem étnico-racial, as rendas domiciliar e pessoal, o estado civil, a escolaridade e a situação de moradia, além de informar se a vítima era transexual. A regra foi inserida na Lei nº 17.394/2021, que criou o Programa de Registro de Feminicídio do Estado.

Também passaram a valer, no fim do ano passado, três iniciativas que destinam recursos a filhos de vítimas de feminicídio. As verbas poderão partir dos fundos estaduais de Desenvolvimento Social (Lei nº 18.103), de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente (Lei nº 18.104) e de Assistência Social (Lei nº 18.105).

DISCRIMINAÇÃO – Lei define feminicídio como assassinato cometido por razões da condição de sexo feminino. Foto: Pixabay/CC0

Ainda em 2022, foram feitas modificações na Lei nº 13.302/2007, que estabelece os princípios e diretrizes para a elaboração e execução das políticas públicas de enfrentamento à violência contra a mulher. A redação dada pela Lei nº 17.788 assegura condições para o exercício efetivo de um amplo espectro de direitos, entre eles, a vida, segurança, saúde, alimentação, moradia, lazer, trabalho, cidadania, liberdade e respeito.

A norma também prevê atendimento policial especializado e humanizado nas delegacias da mulher, além de garantir a preservação do sigilo dos dados das vítimas e dos dependentes delas. Ainda determina a realização de campanhas educativas, a celebração de convênios com órgãos governamentais e a ampliação dos serviços de abrigamento.
Crime hediondo

A lei federal que tipificou o crime de feminicídio em 2015 o define como o assassinato cometido por razões da condição de sexo feminino, isto é, quando o crime envolve violência doméstica e familiar, menosprezo ou discriminação à condição de mulher. A pena prevista é de reclusão de 12 a 30 anos. Ao incluir o feminicídio como circunstância qualificadora do homicídio, ele foi adicionado ao rol dos crimes hediondos.

INICIATIVA – Deputado William Brigido é autor da Política Estadual de Enfrentamento ao Feminicídio. Foto: Evane Manço

Em Pernambuco, a Política de Enfrentamento ao Feminicídio tem, entre os objetivos, o de fortalecer a rede de atendimento às vítimas. Apresentado pelo deputado William Brigido (Republicanos), o texto alerta para o racismo patriarcal e fala da necessidade de promoção de uma mudança cultural diante das discriminações e estereótipos em que se baseiam a violência contra as mulheres.

Além disso, a norma defende parcerias entre órgãos governamentais e instituições de Ensino Superior, visando ao apoio técnico especializado e à promoção de estudos, debates e campanhas educacionais. Outros pontos-chaves são o acompanhamento psicológico das sobreviventes de tentativas de feminicídio, a prioridade em programas sociais e o cuidado para evitar a revitimização.
Órfãos do feminicídio

A Lei 17.666, por sua vez, visa garantir atenção multissetorial àqueles cujas responsáveis legais foram vítimas de feminicídio. “Em geral, pouco é visibilizado o impacto dessa violência sobre a vida de inúmeras crianças e adolescentes que, não raras vezes, foram testemunhas dos crimes cometidos pelos seus próprios pais contra a vida de suas mães”, reforçou a deputada Delegada Gleide Ângelo (PSB) quando apresentou a matéria.

A norma busca promover o direito a assistência social, saúde, alimentação, moradia, educação e assistência jurídica gratuita para órfãos do feminicídio e responsáveis legais. Também assegura prioridade nos atendimentos médico e psicossocial e na assistência jurídica, que devem ser gratuitos. E menciona, ainda, a integração operacional dos órgãos de justiça, a matrícula em instituição educacional próxima ao domicílio e a capacitação tanto para servidores que atuam nas redes de atendimento como àqueles que ofertarem lar provisório.

RECURSOS – “Espero que as normas ajudem a minimizar as privações por que passam tantos órfãos gerados pela violência”, salientou Gleide Ângelo. Foto: Roberto Soares

A parlamentar também é autora das leis que autorizam o uso de recursos de fundos estaduais para os dependentes das vítimas desse crime. “Espero que isso ajude a minimizar as privações por que passam tantos órfãos gerados pela violência”, salientou Gleide Ângelo durante a discussão do projeto na Assembleia.

Na prática

Coordenadora do Núcleo Especializado de Violência Doméstica (Nudem) da Defensoria Pública de Pernambuco (DPE-PE), Virgínia Moury Fernandes assinala que as novas leis vão ao encontro de alguns pontos que considera prioritários. Ela observou que há poucos serviços especializados para mulheres que sobrevivem a tentativas de feminicídio ou menores de idade que tiveram as mães assassinadas.

“A norma está sendo colocada em prática. Estamos tentando verificar onde estão ocorrendo os casos de feminicídio, para mandar equipes ao local e tentar reduzir e fortalecer a rede de proteção às mulheres”, diz a defensora pública.

A partir da experiência diária com casos de violência doméstica contra a mulher, ela percebe que algumas delas têm vergonha de denunciar. As campanhas sobre o tema têm impacto em encorajar as queixas, mas, após anos de agressões, as vítimas podem sofrer um trauma ainda maior ao repetirem seus relatos a cada serviço que venham a buscar, caso não haja uma escuta adequada. Ela aponta, ainda, a necessidade de interiorizar os serviços da rede de atendimento.

Crédito das imagens em destaque (home e Notícias Especiais): Pixabay CC0

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