Fotos de obras contra a seca no Nordeste são usadas fora de contexto nas redes

Inauguração de trecho da transposição do Rio São Francisco pelo presidente Jair Bolsonaro impulsionou desinformação no Facebook

Pedro Prata
Estadão 

É falsa uma postagem no Facebook que compara duas imagens para supostamente mostrar diferentes estágios da construção do Eixo Norte da transposição do Rio São Francisco. Uma das fotos usadas no post mostra um canal coberto de terra atravessado por cabras; a outra, um açude repleto de água. Na verdade, nenhuma das duas imagens representa a obra em questão. O presidente Jair Bolsonaro compareceu à inauguração de trecho do Eixo Norte nesta sexta-feira, 26, e desde então o empreendimento tem sido tema de desinformação.

Imagens não são das obras do Eixo Norte da transposição do Rio São Francisco.
 Foto: Reprodução

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As duas imagens são acompanhadas de uma legenda que afirma falsamente que as fotos mostram estágios diferentes de conclusão da transposição do rio São Francisco para o reservatório de Jati, em Penaforte, no Ceará. O estágio deteriorado seria “fruto do abandono do PT”, ao passo que a imagem do canal em funcionamento seria resultado da gestão Bolsonaro. Porém, o mecanismo de busca reversa do Google permitiu identificar que nenhuma das duas fotos foram feitas no trecho do reservatório Jati.

A imagem com um canal repleto de areia atravessado por cabras e vegetação crescendo foi tirada pelo fotógrafo Wilson Pedrosa para o Estadão em 30 de novembro de 2011. Ela representa trecho então abandonado do Eixo Leste, entre os municípios pernambucanos de Custódia e Betânia.

Detalhes como a cor dos animais e o formato das plantas 
permitem concluir se tratar da mesma imagem.
 Foto: Wilson Pedrosa/Estadão

A foto ilustrou reportagem do Estadão de 5 de dezembro de 2011 sobre auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) que identificou prejuízo de R$ 8,6 milhões na obra. Entre os principais problemas apontados na época estavam “superfaturamento de preços, fiscalização omissa e atraso injustificável nas obras”. O Eixo Leste foi inaugurado em março de 2017, na gestão do ex-presidente Michel Temer (MDB). Seu início se deu uma década antes, durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Reprodução da edição de 5 de dezembro de 2011 do ‘Estadão’

Já a imagem de um canal repleto de água na verdade representa o Açude de Castanhão, no Ceará. Suas obras tiveram início em 1995 e término em 2003, segundo dados do Departamento Nacional de Obras contra a Seca (DNOCS). A busca reversa no Google encontrou a foto em uma matéria da Agência Brasil publicada em 3 de setembro de 2017 sobre o menor volume de água de sua história. A foto foi creditada ao Ministério da Integração Nacional.

Banco de imagens do Ministério da Integração onde está a foto original utilizada no boato.
 Foto: Reprodução

O Estadão Verifica pesquisou por imagens do açude no banco de imagens do ministério e encontrou a foto original. O site informa que ela foi feita em 1º de janeiro de 2001. Alguns detalhes na imagem permitem concluir que é a mesma utilizada no boato.

Alguns detalhes na paisagem permitem identificar que se trata da mesma imagem. 
Foto: Ministério da Integração/Divulgação

Esse boato também foi checado pelo Aos Fatos.

Este boato foi checado por aparecer entre os principais conteúdos suspeitos que circulam no Facebook. O Estadão Verifica tem acesso a uma lista de postagens potencialmente falsas e a dados sobre sua viralização em razão de uma parceria com a rede social. Quando nossas verificações constatam que uma informação é enganosa, o Facebook reduz o alcance de sua circulação. Usuários da rede social e administradores de páginas recebem notificações se tiverem publicado ou compartilhado postagens marcadas como falsas. Um aviso também é enviado a quem quiser postar um conteúdo que tiver sido sinalizado como inverídico anteriormente.

Um pré-requisito para participar da parceria com o Facebook é obter certificação da International Fact Checking Network (IFCN), o que, no caso do Estadão Verifica, ocorreu em janeiro de 2019. A associação internacional de verificadores de fatos exige das entidades certificadas que assinem um código de princípios e assumam compromissos em cinco áreas: apartidarismo e imparcialidade; transparência das fontes; transparência do financiamento e organização; transparência da metodologia; e política de correções aberta e honesta. O comprometimento com essas práticas promove mais equilíbrio e precisão no trabalho.

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