Enem sob Bolsonaro: do medo da censura à demonstração de incompetência



Quando Jair Bolsonaro assumiu a Presidência da República, um dos receios quanto ao Exame Nacional do Ensino Médio era a possibilidade de censura por parte do governo.

Para ele, o maior problema da prova do Enem era uma paranoia vazia com questões com o que ele chama de "ideologia de gênero". Em novembro de 2018, indignado com uma das perguntas do exame que tratava de dialetos de minorias, prometeu que iria vistoriá-las antes para retirar conteúdo. Em suma, censura. "Podem ter certeza e ficar tranquilos. Não vai ter questão desta forma ano que vem, porque nós vamos tomar conhecimento da prova antes. Não vai ter isso daí", afirmou.

Apesar da ausência de questões sobre alguns temas, como a ditadura militar, não é possível dizer que a orientação ideológica do governo gerou prejuízo à prova.

A realidade apontou, contudo, que o principal problema envolvendo o Enem 2019 acabou sendo bem mais prosaico: incompetência aliada à soberba e à falta de transparência.

Estudantes que se sentiram prejudicados pelos erros no Enem 2019 estão registrando representações no Ministério Público Federal, que exige revisão geral da correção da prova, auditoria transparente nos processos e suspensão da seleção pelo Sisu - o Sistema de Seleção Unificado - enquanto tudo não for resolvido. As reclamações pipocaram nas redes sociais logo após o ministro Abraham Weintraub ter dito que este foi "o melhor Enem de todos os tempos" no dia 17.

O último lance, nesta sexta (24), foi a suspensão da etapa de seleção do Sisu por determinação da Justiça Federal de São Paulo. 

Quando o MEC informou, em abril, que a gráfica que imprime o Enem, desde 2009, anunciara falência, quem acompanha a prova ficou apreensivo. Isso já seria um problema desgraçadamente grande se o ministério fosse gerido por um governo racional. Mas, transformado na Casa da Mãe Joana, com pessoas que não ficam no cargo o suficiente para esquentar a cadeira, sem planejamento, comando ou autocrítica e tendo sido loteado, na época, para pupilos de um polemista narcisista de extrema direita, a instituição estaria mais vulnerável a falhas.

Como já disse aqui, uma lição que o presidente ainda não aprendeu é que governar o Brasil não é dirigir um conversível esportivo, em um dia ensolarado, por uma estrada vazia e reta, sem buracos, nem obstáculos, com o canto de pássaros, um tanque cheio e o aplauso dos pedestres. É um rali, em um lamaçal, em fúria de tempestade, com árvores e pedras caindo a todo o instante, sob o risco de derrapar para um desfiladeiro, em um Fiat 147 lotado e cheio de goteiras, com mosquitos por todos os lados, ouvindo vaias da torcida e o tanque eternamente na reserva.

O Brasil precisa de um ministério que seja capaz de conduzir a Educação sob qualquer circunstância e não larga-la no meio do caminho para caçar fantasmas e combater moinhos de vento. Decisões assim cobram seu preço. E quem paga é a população.

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