Decisão sobre combustível é 'meia derrota' ou 'meia vitória' de Haddad?

OPINIÃO

FOTO: Rovena Rosa/Agência Brasil


A conclusão que se pode tirar desse episódio da volta da tributação dos combustíveis é que se criou muito barulho por (quase) nada. Da fritura do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e de sinais de falta de responsabilidade fiscal, aos temores de que a retomada dos impostos traria uma onda de inflação, com prejuízos políticos para o governo, a saída encontrada mostra que não havia base para os exageros disparados com insistência.

O governo voltará a taxar combustíveis, mas gasolina pagará mais que etanol, segundo a "Folha de S.Paulo". Se a informação for confirmada, quem saberá dizer se a decisão de tributar combustíveis de modo diferenciado foi uma "vitória" ou uma "derrota" de Haddad? A resposta nunca será conclusiva porque se apoia num falso dilema.

Os analistas do mercado financeiro que se apoiaram nesse falso dilema e insistiram na tecla de que o presidente Lula estaria fritando o ministro que ele mesmo escolheu, com não mais de 60 dias de governo, devem estar agora em busca de uma desculpa qualquer para a avaliação sem base.

Até mesmo do ponto de vista lógico, não haveria sentido em desprestigiar o ministro, justamente quando Haddad se lança nas complicadas discussões da nova âncora fiscal, em substituição ao teto de gastos. E, mais ainda, no debate da reforma tributária.

Tributação de combustíveis vai puxar inflação?

Já era evidente que a reoneração, total ou parcial, dos combustíveis teria influencia limitada sobre a marcha da inflação. A economia está rateando e a inflação, segundo projeções confiáveis, deve recuar no primeiro semestre, talvez até perto do centro da meta de inflação do ano, de 3,25%, no acumulado em 12 meses.

Antes, porém, não custa lembrar que os preços dos combustíveis nas bombas são livres e que, portanto, aumentos ou reduções de impostos podem ser ou não integralmente repassados aos preços finais de venda. Nestas semanas em que a volta da tributação dos combustíveis ficou na berlinda, pipocaram relatos de aumentos preventivos de preços nos postos de combustíveis.

Além disso, a Petrobras tem alguma gordura para manejar as variações de preços e, um pouco mais à frente, promete substituir o sistema de formação de preços que considera ser importado em dólares todo o combustível consumido no país, por outro em que custos locais também serão levados em conta.

Preços voltam à direção correta

Agora a expectativa é a de que os impostos sobre os combustíveis, além de recompor a arrecadação federal, voltem a operar na direção correta. Que direção é essa?Primeiro, dar menos incentivos tributários aos combustíveis fósseis, poluidores, caso da gasolina, que também impacta mais os orçamentos das famílias de maior renda.

Segundo, espera-se que a lógica da tributação diferenciada também afete, diferenciadamente, outros combustíveis, de modo a não gravar demais o consumo das populações de menor renda. Isso deveria pegar o diesel, que influencia preços em geral e, principalmente, preços das cadeias de alimentos, bem como os preços do gás de cozinha. O diferencial em favor do etanol é também bem-vindo, na medida em que fortalece a produção local e incentiva um combustível de fonte renovável.

Uma lição que talvez seja útil extrair do episódio é o de que não tem muita serventia transplantar para o governo Lula, sem as devidas adaptações, elementos e ferramentas eficazes na análise dos movimentos do governo de Jair Bolsonaro.

A divisão entre "alas políticas" e "alas técnicas", tão repetida ao longo do governo anterior, não funciona muito bem com o atual. Até porque a montagem dos escalões do Executivo não obedeceu a essa lógica. E, antes de tudo, porque com Lula não tem "Posto Ipiranga".

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